Com frequência tomamos conhecimento de propostas para novas infraestruturas de transportes. Algumas, obviamente, justificar-se-ão. Portugal tem ainda um longo caminho a percorrer no que respeita à otimização do seu sistema de transportes públicos. Mais raro é, no entanto, sermos confrontados com propostas de recuperação de infraestruturas já existentes que foram abandonadas e/ou desativadas há longos anos. Temos um elevado número destes casos de abandono. Principalmente em infraestruturas de transporte sobre carris, sejam elas linhas ferroviárias clássicas ou redes de elétricos urbanos. A título de exemplo, só na Região Norte, a mais populosa do país, citamos algumas:
- Linha do Tâmega – Pelo menos até à Amarante, tendo em conta a massa populacional envolvida, justifica plenamente a sua transformação numa linha de “tram-train” moderna ou, melhor ainda, a sua recuperação como via ferroviária pesada e a sua integração no sistema de comboios urbanos da CP Porto;
- Linha do Corgo – Principalmente o troço Régua Vila-Real, cosendo estas duas cidades e criando uma urbe duriense com massa crítica;
- Linha do Vouga – Atravessa uma das mais importantes regiões industriais portuguesas; está ainda ao serviço mas em condições muito degradadas;
- Linha de Leixões – Em plena metrópole portuense, além de esperar um aproveitamento sério para os comboios urbanos, também pode – e deve! – ser aproveitada para ligar o Aeroporto Francisco Sá Carneiro à rede ferroviária nacional [1];
- Ramal da Alfândega – Aquela que nos traz aqui, em pleno casco urbano portuense.
O Ramal da Alfândega [2] é um troço ferroviário, com a extensão de 3,896 km, entre a Estação de Porto Campanhã e a Antiga Alfândega do Porto em Miragaia. Foi inaugurado em 1888 e encerrado ao tráfego um século depois em 1989. Durante toda a sua vida foi utilizada exclusivamente para o transporte de mercadorias. É uma linha de acentuada inclinação que liga a zona Ribeirinha à cota alta de Campanhã através da escarpa sobranceira ao Douro. Neste momento toda a infraestrutura está abandonada e sem utilidade. Existe uma Associação que peleja em sua defesa: o GARRA – Grupo de Ação para a Reabilitação do Ramal da Alfândega – que defende a sua reabilitação como prolongamento de um serviço de passageiros entre a Alfândega portuense e a Estação Ferroviária de Leixões [3]. A proposta que pretendo aqui desenvolver é, no entanto, outra: a sua recuperação e transformação numa linha de elétrico urbano plenamente integrado na rede de elétricos do Porto cuja recuperação também urge.
O que proponho é a integração da Linha da Alfândega na Linha de elétrico que percorre a marginal fluvial e marítima da cidade do Porto, ligando-as no ponto onde se cruzam (Infante), e recuperando também o troço de linha de elétrico que vai do Passeio Alegre até ao Castelo do Queijo. Este troço na marginal marítima, malfadadamente, foi levantado durante a vigência dos mandatos de Rui Rio à frente da edilidade portuense. No Castelo do Queijo, em cuja rotunda ainda se conserva a infraestrutura ferroviária, esta linha derivaria para Matosinhos Sul, fazendo aí ligação com o Metro do Porto, e em direção à Avenida da Boavista recuperando o antigo canal ferroviário que durante muitas décadas serviu esta via estruturante da cidade. A estação de origem poderá ser construída no espaço existente entre a Estação de Campanhã e a Fábrica Ceres, incluindo uma estação a que chamaríamos “Freixo” ou “China”, para servir aquela área onde se encontra a antiga central da EDP, outra na Ponte D. Maria Pia, com elevador, integrada num futuro aproveitamento desta obra de arte. Estando a linha de elétricos da marginal também ligada a uma outra zona da cidade de cota alta, Hospital de Santo António – Carmo – Leões, pela linha que parte de Massarelos, teríamos já aqui um embrião para aquilo que seria a futura moderna rede de elétricos urbanos do Porto.
Além de grande utilidade para os habitantes e utilizadores da cidade, esta linha aqui proposta, teria um inegável valor para a indústria turística local: estabeleceria uma ligação direta da Estação de Porto Campanhã a Matosinhos percorrendo um trajeto de elevado interesse arquitetónico e paisagístico. A sua construção, visto que se baseia em infraestruturas já existentes, que apenas necessitam de recuperação e adaptação a esta nova finalidade, será sempre mais fácil e menos dispendiosa que a construção de qualquer canal novo. Este projeto pode ser o vetor fundamental para a recuperação urbana e paisagística de toda a escarpa ribeirinha desde as Fontainhas até à Quinta da China em Campanhã e, também, para o aproveitamento pedonal e ciclável em que poderá transformar-se a ponte D. Maria Pia.
[1] http://www.ocomboio.net/PDF/antonioalves_jan2008_asc_via_leixoes.pdf
[2] http://pt.wikipedia.org/wiki/Ramal_da_Alf%C3%A2ndega
[3] http://www.jn.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=515607&page=-1
António Alves
Das propostas mais estruturadas que tive o prazer de ler e se for necessário recolher apoios além Grande Porto conta comigo.
Obrigado 😉
Caro António Alves,
Bravo. Esta é um projecto estruturante e importante quer para o turismo, como disse, quer ainda pelo lado social, pois permite um melhor acesso da população do Porto central e oriental às suas praias, Foz e Matosinhos, diminundo ainda o tráfego automóvel na zona litoral (que é imperativo, sobretudo aos fins-de-semana).
Pela minha situação não tenho neste mmomento acesso aos documentos necessários, mas tenho a certeza que a destruição da linha de eléctrico que passa pela Foz foi obra TAMBéM da gestão de Fernando Gomes. Esta sua proposta, muito boa, perde um pouquinho por este lado menos verdadeiro.
Mas parabéns por ressuscitar este tema tão importante.
Abraço
Joaquim
porque vejo que a minha identificação não aparece e porque o meu endereço pode ser público:
Joaquim PInto da Silva
joaquimpintodasilva@gmail.com
Caro Joaquim Pinto Silva,
Obrigado pelo seu apoio. O factor social que realça é também muito importante e ainda bem que mo lembra pois esqueci-me de o realçar no meu texto.
Na verdade no âmbito da Porto 2001 (mandatos de Fernando Gomes e Nuno Cardoso) foi relançado o projecto de recuperação da rede de eléctricos. Toda a linha marginal foi renovada até ao Castelo do Queijo e os carris foram mesmo estendidos a Matosinhos Sul. Infelizmente anos mais tarde Rui Rio mandou levantar os carris em toda a extensão da marginal marítima. São factos.
Parabéns, por mais uma proposta com pés e cabeça. Espero que o actual presidente da CM do Porto tenha um sentido de serviço público que Rio nunca teve; com ele, a proposta terá pés para andar (que com os actuais administradores da STCP é melhor não contar, nem muito menos com a inútil AMTP).
Obrigado .A luta continua! 😉
Também já tinha pensado nesta ideia, mas eu iria mais longe com a ligação de elétrico entre Campanhã e a Estação de General Torres em Gaia utilizando para o efeito a Ponde D. Maria para a circulação do elétrico e sendo outra forma de ligação entre amos os interfaces de metro. E a restante ideia entre Campanhã/Elevador dos Guindais/Alfandega… tudo com elétricos! que potencial turístico e de transporte de passageiros seria!
Concordamos, Paulo. O elétrico nunca devia ter deixado de ser uma opção para os habitantes do Grande Porto. Cumprimentos.